Publicamos aqui a nossa tradução livre das belas palavras sobre esta profissão proferidas por ocasião do discurso de Sua Santidade Pio XII no primeiro congresso italiano de estomatologia a 24 outubro de 1946:
Trata-se, pois, de uma arte excelente, feita de intuição natural e de uma experiência longa e cuidadosamente adquirida, capaz de diagnosticar as causas, por vezes distantes e muitas vezes escondidas por detrás de sintomas externos visíveis ou apenas sentidos. A esta arte, de carácter intelectual, deve acrescentar-se uma hábil destreza para preparar e executar trabalhos de tanta precisão com perfeita exatidão, com a segurança de vista e de mão que eles exigem.
É igualmente indispensável ter um fino tato e um sentido psicológico para possuir a força da persuasão e a autoridade moral, frequentemente necessárias para evitar ou superar as relutâncias ou apreensões instintivas, normalmente ainda mais penosas e rebeldes do que o próprio sofrimento.
Mas, acima de tudo isso, que constância, que paciência, que resistência física precisam! Que esforço têm que suportar – muitos de vocês, talvez por longos dias, por longos anos, – numa tensão constante dos vossos sentidos, dos vossos nervos, de todo o vosso corpo, do vosso espírito, da vossa vontade, da vossa sensibilidade, sempre de pé, numa posição muitas vezes desconfortável, olhos fixos em atenção, as mãos ocupadas, cada uma de seu lado , as quais têm que ser mantidas ágeis e sem contrair os dedos ao manusear vários instrumentos ao mesmo tempo, movimentos muitas vezes difíceis devido aos reflexos e às reações do paciente, que nem sempre se conseguem prevenir! E em toda essa intensa aplicação têm que conservar imutáveis a calma, a cortesia, a doçura e o espírito de caridade!Se todos nós soubéssemos e ponderássemos todas estas circunstâncias, compreenderíamos melhor o segredo da vossa estima e do vosso amor pela profissão à qual se dedicam, pela sua beleza técnica e pela sua beleza moral, e pelos benefícios que dela derivam.
Mais tarde, em 1957, por ocasião de um discurso do mesmo douto Papa aos participantes do XII Congresso Internacional de odontoestomatologia da Federação Dentária Internacional, expressaria muitas das preocupações que são ainda hoje atuais na saúde oral e que, como expressámos acima, serão umas das nossas principais preocupações.
Uma das mais felizes consequências do desenvolvimento universal das disciplinas médicas é, na verdade, a sua aproximação, demonstrando a sua interdependência. Ora, e se há uma parte do organismo em que essa observação é notavelmente verificada, essa é claramente a região oral, ponto de partida do sistema digestivo, sede do sentido gustativo e parte essencial dos órgãos da fala. Mas ficaríamos aquém da realidade pensando apenas nas funções mecânicas e fisiológicas localizadas nessa região. Verificou-se que as estruturas e o estado da cavidade bucal afetam, e por vezes decisivamente, a saúde física, nervosa e até mental do indivíduo, o que é facilmente compreendido, se considerarmos as consequências de uma má oclusão dentária em operações tão essenciais à vida do corpo e da mente como a respiração, a mastigação e articulação da palavra.
A partir das observações clínicas de muitos médicos e das pesquisas sistemáticas cientificamente perseguidos, nasceu a ortopedia dento-facial, da qual surgiu um ramo importante, a odontopediatria, consagrada às crianças.
(…) Todos os especialistas concordam que, como em outras áreas, a prevenção é a única maneira de ajudar grandes grupos sociais. Ora, no que diz respeito à ortodontia, os males a prevenir ou a curar podem ter origem pré ou pós-natal, hereditária ou acidental. Uma prevenção eficaz deve, portanto, começar pelo cuidado da mãe antes do nascimento da criança; ele deve acompanhar o crescimento da criança em todas as etapas, desde o surgimento dos primeiros dentes até ao estabelecimento da dentição definitiva. (…)
Também os pais devem garantir que os seus filhos são examinados cedo por um médico dentista e tentar, com sua ajuda, corrigir os hábitos que, embora possam parecer inócuos, nem sempre o são: as crianças que respiram pela boca, ou que continuam a chupar o polegar após a primeira idade, aqueles que mastigam mal ou engolem rápido demais, aqueles que roem as unhas ou que contraem continuamente certos músculos faciais, manifestam sintomas que devem ser combatidos e removidos sem demora. Este controle, excelente fator de educação, não contribui pouco para corrigir defeitos de caráter e para fortalecer a vontade. Devemos estar gratos pela ajuda dada aos pais na delicada tarefa de orientar o crescimento e moldar harmoniosamente a personalidade de seus filhos.
A ortopedia dento-facial pode, constatamos, melhorar muito o desenvolvimento de algumas crianças e adolescentes. (…) Uma organização racional das inspeções médicas desde a primeira infância torna assim possível evitar malformações congénitas a tempo, detetar e tratar sem demora os primeiros sintomas de distúrbios locais ou mesmo gerais pois, tal como no caso da diabetes, é na boca que eles se manifestam em primeiro lugar.